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16/09/21 - Profissão militar e intervenção política

Atualizado: 21 de set. de 2021


Resenha sobre o artigo "Forças Armadas no Brasil: profissão e intervenção política", publicado na Revista Brasileira de Informação Bibliográfica em Ciências Sociais (BIB), n. 96, edição agosto/2021. Autores: Profa. Dra. Ana Penido (Universidade Estadual Paulista - UNESP), Prof. Dr. Frederico Costa (Universidade Federal Fluminense - UFF) e Profa. Ma. Maria Janot (UFF, UNESP). O artigo pode ser acessado na íntegra pelo link https://anpocs.com/images/BIB/n96/BIB_96_2.Foras_armadas.pdf.




RESUMO (extraído do artigo original)


"O artigo discute a participação militar na política com ênfase, embora não exclusiva, no Brasil. A hipótese a ser discutida não é nova, pois, a partir do trabalho de Samuel Huntington (1996), tornou-se lugar comum traçar uma linha de continuidade entre a profissionalização e a neutralidade política e militar. No entanto, a partir do balanço da literatura especializada, essa hipótese pode ser questionada em função do persistente fenômeno da intervenção militar na política. O argumento central deste artigo é o de que, em determinados contextos sociais, históricos e políticos de países como o Brasil, a intervenção militar na política é uma função direta da profissionalização, tornando possível afirmar que profissionalizar implicou preparar os militares para a ação política interventora.

Palavras-chave: Relações civis-militares; Forças armadas; Profissionalização militar; Intervenção militar".



RESENHA


O estudo sobre a participação de militares na vida política - seja na forma de atuação institucional, seja na forma de grupos isolados - não é novidade no Brasil, principalmente a partir dos anos 1990. A maior parte dos artigos e livros publicados têm, como foco, o Regime Militar de 1964-1985, o que se justifica pela atipicidade de sua duração e por seus desdobramentos na vida política brasileira. O que diferencia o artigo ora comentado dos demais é que, como expõe o próprio resumo, ele questiona o argumento de que uma crescente profissionalização dos militares levaria a uma correspondente neutralidade política. O artigo procura retomar, no sentido inverso às análises moldadas pela conjuntura, os trabalhos clássicos sobre as relações civis-militares, com o foco na profissionalização das Forças Armadas (FFAA) e na sua relação com a tendência intervencionista dessas instituições.


Além das funções de defesa, os autores evidenciam que os militares brasileiros auxiliaram na coesão e modernização do Estado, intervindo na política com posturas pró ou contra o governo, previstas ou não na Constituição, com ou sem o apoio popular. Isso significa que, no Brasil, as participações militares na política, nem sempre de maneira golpista, são a regra, e não a exceção; e que as relações entre Estado, sociedade e Forças Armadas (FFAA) foram, na maior parte do tempo, pouco harmoniosas. Essas ações políticas interventoras, que extrapolam os movimentos ou pressões tipicamente armados, também parecem escapar à maior parte da literatura especializada.


No sentido da profissionalização das FFAA, o artigo associa a função militar a uma profissão, entre as várias da burocracia estatal, responsável pelo monopólio da administração da violência do Estado, e que, em função disso, desenvolvem características próprias, como o corporativismo, seu comportamento político e a organização da profissão como uma burocracia estatal. Com base nos parâmetros articulados na obra O Soldado e o Estado, de Samuel Huntington - onde é possível encontrar militares extremamente profissionais que interveem na política -, o trabalho trata a profissionalização e a participação política militar como variáveis independentes, e o controle civil como algo pouco natural. Cabe ressaltar, no entanto, que existem pelo menos dois fatores que determinam se a profissionalização das forças armadas (em qualquer país) implicará em uma maior ou menor neutralidade política dos militares: o primeiro seria o foco da profissionalização - se voltado para ameaças internas ou externas -, o que depende do nível real de ameaças externas percebidas pelas instituições militares, pela classe política e pela sociedade em geral; o segundo fator, apontado pelos autores do artigo, seria a tendência para os militares aceitarem a subordinação do poder militar ao poder civil, o que será maior em paises com elevada cultura política e força das instituições do Estado.


A matéria traz uma interessante explicação para que que os militares busquem o protagonismo na implantação de uma realidade que lhes pareçam mais adequada aos "interesses nacionais". Essa explicação foi extraída pelos autores do livro Em busca de identidade: o Exército e a política na sociedade brasileira, de Edmundo Soares Coelho: a de que existe uma "falta de reconhecimento" por parte dos militares, e que essa percepção, que pode em alguns casos ser o estopim para movimentos bruscos, se caracterizaria por dois tipos de orfandade: a primeira, uma orfandade funcional, em virtude da qual os militares creem firmemente que a sociedade e sua elite política não lhes têm qualquer apreço, considerando-os dispensáveis quanto a sua função clássica de defesa nacional; a segunda orfandade é a institucional, a convicção de que não há quem os ouça ou se interesse pelas suas questões, quem advogue pelos seus pleitos, que se empenhe pela integridade da sua organização. Por isso, caberia aos militares uma conduta de protagonismo, definindo de forma autônoma seus objetivos e suas estratégias no corpo de uma doutrina de defesa nacional eventualmente imposta à nação.


Apesar de não ser mencionado no artigo, é importante trazer à memória o período denominado como "volta aos quartéis", ocorrido após o último governo militar (1985) e, de maneira mais contundente, após a promulgação da Constituição Federal (1988). Nessa época, o País viveu a ilusão de que os militares passariam a se dedicar integralmente às lides da sua profissão, esquecendo-se de que não haviam sido adequadamente tratadas as motivações que os levam a participar eventualmente de ações interventoras de cunho político, econômico e social: a indiferença e o despreparo da classe política na estruturação e na condução dos assuntos de Defesa, e a mentalidade formada em várias gerações de oficiais em considerar natural a participação de militares em outras atividades do Estado. Como o próprio Huntington entende, a profissionalização dos militares teria, como foco, o combate armado contra um inimigo externo, tornando-os estéreis na arena política. Em um país onde as ameaças externas não são claramente percebidas, a premissa de Huntington torna-se de difícil confirmação.

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A divulgação do artigo não implica no endosso automático do MAR & DEFESA às citações dos autores ou da bibliografia citada. No entanto, considera-se que a matéria contém informações de interesse à construção do conhecimento dos seguidores do blog e, portanto, merece ser divulgada.


MAR & DEFESA

Poder Marítimo e Defesa Nacional

maredefesa@maredefesa.com.br

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